A crescente presença da Inteligência Artificial (IA) em diversos setores está redefinindo a maneira como a ciência da computação é ensinada, exigindo uma reavaliação tanto das abordagens pedagógicas quanto das habilidades necessárias para o mercado de trabalho.
No semestre passado, Eric Klopfer, professor do MIT, realizou um experimento intrigante com sua turma de ciência da computação. A turma foi dividida em três grupos, e cada grupo recebeu uma tarefa de programação na linguagem Fortran, desconhecida para todos os alunos.
- Grupo 1: Usou o ChatGPT como ferramenta para resolver o problema.
- Grupo 2: Contou com o modelo Code Llama, da Meta.
- Grupo 3: Teve acesso apenas ao Google como recurso.
Os resultados seguiram um padrão esperado: o grupo que utilizou o ChatGPT resolveu a tarefa mais rápido, seguido pelo grupo com Code Llama, enquanto o grupo que se apoiou no Google levou mais tempo por precisar quebrar a questão em partes menores e buscar as respostas manualmente.
Porém, quando os alunos foram testados novamente, sem a ajuda das ferramentas, o cenário se inverteu. “O grupo que utilizou o ChatGPT não conseguiu se lembrar de nada e falhou no teste,” explicou Klopfer. Já metade dos alunos do Code Llama passou na prova, e todos os alunos que usaram o Google tiveram um bom desempenho.
Uma Lição Sobre Aprendizado
Segundo Klopfer, “a prática e o enfrentamento de dificuldades são fundamentais para o aprendizado.” Quando recebemos respostas prontas, perdemos a chance de raciocinar e desenvolver habilidades críticas. Além disso, o uso da IA para resolver problemas complexos pode ser frustrante, pois erros exigem recomeçar do início. Por outro lado, dividir uma tarefa em partes menores facilita o uso de ferramentas e promove um aprendizado mais significativo.
A Ciência da Computação Permanece Essencial
Apesar das inovações tecnológicas, especialistas como Klopfer acreditam que a educação em ciência da computação continua indispensável. Mesmo com o apoio de IA, entender fundamentos como algoritmos, estatística e funcionamento de sistemas é crucial para formar profissionais competentes.
Beena Ammanath, especialista em tecnologia ética na Deloitte, reforça: “Ainda é fundamental dominar os conceitos básicos para formar cientistas da computação eficazes.”
Novas Oportunidades e Mudanças no Mercado de Trabalho
Embora exista preocupação sobre a substituição de empregos pela IA, uma pesquisa do MIT sugere que a automação completa pode levar mais tempo do que se imaginava. Apenas 23% das tarefas associadas à visão computacional podem ser economicamente substituídas por IA atualmente, indicando que a transição será gradual.
Além disso, a IA não necessariamente elimina funções, mas transforma as atividades envolvidas. A programação, por exemplo, pode evoluir para um foco maior na definição de requisitos e validação, enquanto a codificação manual passa a ser mais automatizada.
O Ensino de Computação e a Função da IA
Ferramentas como o Copilot, da Microsoft, estão reformulando o ensino de programação, tornando-o mais dinâmico e acessível. Professores, como Risto Miikkulainen, da Universidade do Texas, defendem que essas ferramentas agem como tutores, auxiliando os alunos no processo de aprendizado. Assim como calculadoras não eliminam a necessidade de entender aritmética, as ferramentas de IA não substituem a importância de compreender a lógica por trás da programação.
Além disso, disciplinas como IA responsável e prevenção do uso indevido de tecnologia se tornarão parte essencial do currículo. Profissões emergentes, como engenheiros de aprendizado de máquina, especialistas em MLOps e consultores de conformidade regulatória, também ganharão relevância.
O Impacto da IA na Educação em Ciência da Computação
Preparação Desde a Educação Básica
Julie York, da Computer Science Teachers Association, ressalta a importância de introduzir conceitos de ciência da computação desde a infância. Alunos do ensino fundamental podem aprender o que é um assistente virtual e desenvolver habilidades para navegar com segurança no meio digital.
York também destaca o papel do pensamento crítico na compreensão dos dados e na forma como eles são utilizados. Para ela, a IA deve ser encarada como uma parceira na resolução de problemas, e não como uma substituta para o esforço humano e a criatividade.
Transformação do Mercado: Surgimento de Novas Funções
Embora a IA possa automatizar algumas tarefas, especialistas concordam que novas oportunidades de trabalho estão surgindo. Um exemplo é a engenharia de prompts, uma habilidade emergente que envolve a elaboração de comandos claros e eficazes para sistemas de IA. Assim como abreviações se popularizaram na comunicação online, aprender a “falar em prompts” pode se tornar uma habilidade essencial no futuro digital.
Desafios e Equidade no Acesso à Educação
York também aponta para a necessidade de garantir equidade no acesso ao ensino de ciência da computação. Escolas em áreas mais favorecidas já oferecem cursos de programação, enquanto estudantes de regiões menos privilegiadas podem ficar para trás. É essencial democratizar o acesso para que todos possam acompanhar as exigências do mercado de trabalho em transformação.
Conclusão
A chegada da IA representa tanto um desafio quanto uma oportunidade para a educação em ciência da computação. Cabe ao sistema educacional evoluir junto com essas mudanças, preparando as próximas gerações para lidar com um mercado de trabalho dinâmico e imprevisível.
Klopfer resume: “Ferramentas como o ChatGPT e o Copilot não devem ser evitadas, mas sim incorporadas à educação de forma inteligente. O desafio é encontrar maneiras de usá-las para complementar e enriquecer o aprendizado, em vez de substituir o processo de pensar e criar.”